Entretempos https://entretempos.blogfolha.uol.com.br Artes visuais diluídas em diferentes suportes, no Brasil e pelo mundo Sun, 28 Nov 2021 14:42:12 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 ‘Missão Francesa’ fascina pois recorre a evento que deixou marca estrutural na mentalidade do país https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2017/11/13/missao-francesa-fascina-pois-recorre-a-evento-que-deixou-marca-estrutural-na-mentalidade-do-pais/ https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2017/11/13/missao-francesa-fascina-pois-recorre-a-evento-que-deixou-marca-estrutural-na-mentalidade-do-pais/#respond Mon, 13 Nov 2017 12:23:58 +0000 https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/files/2017/11/Sequence-01.00_00_51_02.Still002-180x101.jpg http://entretempos.blogfolha.uol.com.br/?p=19783

Como prometi no último vídeo, hoje vou falar sobre o “Missão Francesa”, do André Penteado, lançado pela Editora Madalena em agosto deste ano. Exibo esse fotolivro porque o considero o melhor lançamento brasileiro de 2017. Por quê?

O que me fascina é que o fotógrafo se apoia em eventos que ocorreram dentro de um período curto ou médio da história nacional, mas que deixaram marcas estruturais no país. Com “Missão Francesa”, André investiga a criação da escola de Belas Artes, no Rio. Esse projeto escancara a distância entre o que é idealizado e o que de fato ocorre na prática, um clássico brasileiro.

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Se mantiver fôlego, pentalogia de fotolivros de André Penteado sobre o Brasil será referência https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2017/08/14/se-mantiver-folego-pentalogia-de-fotolivros-de-andre-penteado-sobre-o-brasil-sera-referencia/ https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2017/08/14/se-mantiver-folego-pentalogia-de-fotolivros-de-andre-penteado-sobre-o-brasil-sera-referencia/#respond Mon, 14 Aug 2017 14:21:36 +0000 https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/files/2017/08/5728A-144x180.jpg http://entretempos.blogfolha.uol.com.br/?p=19716 O texto abaixo foi publicado na “Ilustrada” do dia 27 de julho. Como o blog anda bem parado, só agora republico essa análise sobre um importante fotolivro da fotografia contemporânea brasileira.

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Se André Penteado mantiver o mesmo fôlego dos fotolivros “Cabanagem” e “Missão Francesa” –primeiros volumes da pentalogia do paulistano, batizada de “Rastros, Traços e Vestígios”–, certamente o projeto se tornará referência na fotografia do país.

Embora importantes artistas tenham se debruçado sobre temas imprescindíveis para entender o Brasil, em geral o fazem com foco em questões pontuais. Claudia Andujar, por exemplo, é símbolo do registro da questão indígena. Mario Cravo Neto, outro influente nome nacional, fotografou com rara intensidade os ritos afro-brasileiros.

Penteado é mais abrangente. Parte de revoltas emblemáticas para investigar os elementos que formaram a identidade brasileira e que repercutem até hoje: violência, burocracia, religião e a sensação permanente de improvisação.

“Missão Francesa” é uma etapa crucial dessa série. Retorna ao projeto da escola de Belas Artes, no Rio, para escancarar a vala entre o idealizado e o realizado no Brasil.

Para isso, o fotógrafo utiliza uma abordagem seca, detetivesca, sem romantismo, em que reproduz documentos, esculturas e detalhes de quadros, alguns deles editados ao lado de retratos de descendentes do pintor Nicolas Antoine Taunay (1755-1830).

O artista, que veio ao Brasil com a Missão Francesa, retornou ao seu país após se desiludir com o projeto da escola de Belas Artes na prática.

Nota-se ainda uma crítica à ideia de que, para algo dar certo no Brasil, é preciso importar modelos estrangeiros.

Por isso, é irônico que Penteado utilize estética próxima à de Wolfgang Tillmans.

Assim como o artista alemão, o brasileiro constrói jogos de imagens que podem ser desvendados caso o leitor dedique tempo a essa obra aparentemente hermética.

O quebra-cabeça deve ser completado com a publicação dos títulos sobre a Farroupilha e o descobrimento e a independência do Brasil.

MISSÃO FRANCESA
AUTOR
André Penteado
EDITORA Editora Madalena
QUANTO R$ 100

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Sábado reserva programação gratuita com palestra sobre Diane Arbus e lançamento de 12 fotolivros https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2016/08/26/sabado-reserva-programacao-gratuita-com-palestra-sobre-diane-arbus-e-lancamento-de-12-fotolivros/ https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2016/08/26/sabado-reserva-programacao-gratuita-com-palestra-sobre-diane-arbus-e-lancamento-de-12-fotolivros/#respond Sat, 27 Aug 2016 01:44:13 +0000 https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/files/2016/08/AAAAAA-122x180.jpg http://entretempos.blogfolha.uol.com.br/?p=18558 Arbus – Neste sábado (27), às 17h, no Instituto Moreira Salles do Rio, o curador-chefe de fotografia do MET, Jeff Rosenheim, fará palestra sobre a obra da norte-americana Diane Arbus (1923-1971). Rosenheim é o curador da exposição “In the Beginning”, em cartaz no MET Breuer, em NY, até 27 de novembro, e dedicada aos primeiros sete anos de trabalho da artista conhecida por fotos de marginalizados, como travestis, nudistas, deficientes físicos e mentais. O evento será em inglês e sem tradução. A entrada é gratuita, com retirada de senhas 30 minutos antes do início do evento. O IMS fica na r. Marquês de São Vicente, 476, Gávea, tel. (21) 3284-7400.

Fotolivros – Também neste sábado (27), mas em São Paulo, os artistas André Penteado, Gilberto Tomé, Letícia Lampert e Lucia Mindlin Loeb receberão o público para um bate-papo organizado por Denise Gadelha na Livraria da Vila do JK Iguatemi. O evento ocorre paralelamente à feira SP-Arte/Foto, realizada no 3º piso do shopping até este domingo (28). O encontro com os fotógrafos, que discorrerão sobre a “fotografia em livros experimentais”, ocorre entre 17h e 19h. A Livraria da Vila fica no 2º piso do JK Iguatemi (av. Presidente Juscelino Kubitschek, 2041, tel. 11-3152-6800).

Lançamentos – Já o stand da Livraria Madalena na SP-Arte/Foto promove o lançamento de 12 livros neste sábado. Entre 16h e 17h, Oscar Pintor e Letícia Lampert divulgam “@Pintor” e “Chai”, respectivamente. Em seguida, das 17h às 18h, Roberto Vámos, Fernando Lemos e André Hauk e Camila Otto mostram suas obras novas. Na hora seguinte é a vez de Celso Brandão, Misha Vallejo, do veterano Penna Prearo e de Jordi Burch. O trio Alexandre Furcolin Filho, Mariana Tassinari e Carine Wallauer fecha a programação das 19h às 20h. A entrada da feira também é gratuita.

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]]> 0 Fotolivro ‘Aeroporto’, de Cássio Vasconcellos, perde impacto de seu gigantismo ao fragmentar imagem https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2016/03/08/fotolivro-aeroporto-de-cassio-vasconcellos-perde-impacto-de-seu-gigantismo-ao-fragmentar-imagem/ https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2016/03/08/fotolivro-aeroporto-de-cassio-vasconcellos-perde-impacto-de-seu-gigantismo-ao-fragmentar-imagem/#respond Tue, 08 Mar 2016 17:13:12 +0000 https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/files/2016/03/36e620cb58bceac408071cf334317313-180x119.jpg http://entretempos.blogfolha.uol.com.br/?p=16994 Cassio6

‘Aeroporto’, de Cássio Vasconcellos (Editora Madalena) – Há dois anos, o mote do terceiro Encontro Pensamento e Reflexão na Fotografia, realizado no MIS, era “tudo no mundo existe para terminar num livro de fotografia”. Embora quase tudo no mundo exista para terminar num livro de fotografia, nem sempre este é o melhor formato para determinados trabalhos. Em “Aeroporto”, o paulistano Cássio Vasconcellos publica uma de suas obras mais interessantes, na qual, por meio de uma engenhosa manipulação digital com fotos áreas tomadas no Brasil e nos Estados Unidos, constrói uma imensa pista de aviões. Quem já viu a obra em mostras percebe de cara o impacto oferecido pela imagem: um paredão surreal que provoca a imaginação ao exibir um espaço milimetricamente pensado, asséptico e onde tudo se encaixa. Nas exposições, o espectador vê o todo –impressionante– e depois se aproxima para buscar detalhes, num jogo similar ao da série de livros “Onde Está o Wally?”. De perto, identifica companhias aéreas, bagagens, caixotes etc. e se deslumbra com pontos de cores oriundos das pinturas das aeronaves em meio a um vasto campo cinza. O problema na versão em fotolivro é que o processo se inverte. Em vez de iniciarmos a leitura pela perspectiva geral do aeroporto e, com isso, pelo espanto que o gigantismo do trabalho propicia, a obra vem fragmentada em 32 partes. Se o leitor quiser, pode destacar as imagens e remontar o aeroporto, mas quem vai gastar R$ 240 para esfacelar um livro com acabamento tão bem feito, cuja capa, feita de acrílico, remete ao fabuloso “This Year’s Model”, do japonês Go Itami? Tenho dúvidas. Talvez quem não tenha visto “Aeroporto” em museus não sinta falta deste choque inicial. Tenho certeza, porém, de que se trata de um livro interessante; é possível gastar um bom tempo reparando em detalhes da pista, e a inventividade do processo é louvável. Também em exposições, Cássio repetiu o processo de colagem digital ao criar uma praia gigante e lotada.

Avaliação: bom

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Haikai: em críticas curtas, o blog comenta fotolivros lançados neste ano.

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Melhores fotolivros de 2015: Claudio Silvano https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2016/01/06/melhores-fotolivros-de-2015-claudio-silvano/ https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2016/01/06/melhores-fotolivros-de-2015-claudio-silvano/#respond Wed, 06 Jan 2016 11:43:20 +0000 https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/files/2016/01/500-1-180x135.jpeg http://entretempos.blogfolha.uol.com.br/?p=16995 Feliz ano novo! Antes de começar 2016 para valer, ainda temos uma última lista de melhores fotolivros do ano passado. Quem mostra seus eleitos é o fotógrafo brasileiro Claudio Silvano.

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JH Engström – ‘Tout Va Bien’ (Aperture)

Em uma entrevista recente, o sueco JH Engström afirma que “acredita na poesia”. Essa afirmação é bem evidente nas páginas de seu último livro: cada imagem é como um pequeno poema autobiográfico. “Tout Va Bien” é o seu 15º livro e, como em outros trabalhos, mistura diferentes tipos de formatos, fotos em preto e branco com imagens em cores e diversos sujeitos. Não existe uma narrativa bem definida, as imagens estão soltas em uma linha temporal imersa em memórias.

André Penteado – ‘Cabanagem’ (Editora Madalena)

“Cabanagem” é sem dúvidas um dos trabalhos mais ricos e inovadores da fotografia brasileira. E, sendo o primeiro capítulo de uma série, me deixa bastante ansioso pelos próximos projetos.

Alec Soth – ‘Songbook’ (MACK)

Mesmo tendo uma boa sequência e impressão, sem boas fotografias um fotolivro é apenas um objeto. Alec Soth continua explorando a vida nos EUA e criando imagens incríveis. Aqui ele reedita as fotos do seu projeto autopublicado “LBM Dispatch”, espécie de pequeno jornal para o qual viajava fotografando pelo país na companhia do escritor Brad Zellar. Usando um flash superpotente, Soth captura todos os detalhes de pequenas cenas das cidadezinhas que ele visitou.

Paul Kooiker – ‘Nude Animal Cigar’ (Art Paper Editions)

Fiquei hipnotizado quando folheei “Nude Animal Cigar”. Como o título explica, o livro é uma compilação de fotografias de charutos, animais e pessoas nuas. Parecem fotografias encontradas em mercados de pulgas, mas todas foram feitas pelo fotógrafo durante vários anos. O tema pode soar bobo e vazio, mas seu mérito está exatamente na nossa reação ao livro. A cada virada de página você explora um pouco mais desse mundo não linear da obra de Kooiker.

Dana Lixenberg – ‘Imperial Courts 1993-2015’ (Roma Publications)

Imperial Courts” é um monumental trabalho de mais de 20 anos que a fotógrafa Dana Lixenberg fez em uma região da cidade de Los Angeles. O livro é composto de retratos dos vizinhos, amigos e familiares intercalados com paisagens dessa comunidade. É um trabalho complexo sobre a passagem do tempo e a vida dessas pessoas.

Mike Mandel – ‘Good 70s’ (J&L Books)

Fotografia e humor são coisas difíceis de misturar, e muitas vezes o resultado acaba sendo mais constrangedor do que engraçado. Poucas pessoas conseguiram sucesso nessa combinação. Uma delas é Mike Mandel. “Good 70s” é uma caixa com diversos trabalhos do artista, principalmente a coleção completa dos míticos cartões de baseball que criou no começo dos anos 1970. Cada um deles mostra um grande fotógrafo –entre eles Larry Sultan, Ed Ruscha e William Eggleston– posando como jogador de baseball e com sua descrição no verso.

Ron Jude – ‘Lago’ (MACK)

Ron Jude explora sua infância nesse livro que é uma aula de construção de narrativa. Gosto do jeito sutil e eficaz que consegue transmitir uma ideia abstrata utilizando objetos e paisagens.

Mark Steinmetz – ‘The Players’ (Nazraeli)

O fotógrafo Mark Steinmetz continua fazendo bons livros um após o outro. Dessa vez o trabalho é um conjunto de fotos de adolescentes e crianças em pequenos campos de baseball entre 1987 e 1990. Sempre me impressiona a atmosfera poética que ele consegue criar ao capturar a luz natural.

Boris Mikhailov – ‘Diary’ (Walther Konig)

Drama e comédia são elementos definidores da obra de Mikhailov. Esse livro mostra quase 50 anos de momentos capturados por ele, organizados sem cronologia definida e em forma de diário. Às vezes é difícil olhar para algumas de suas imagens, mas a gente sabe que as coisas difíceis também fazem parte das nossas vidas. No final aceitamos isso e continuamos seguindo em frente.

Sohrab Hura – ‘Life is Elsewhere’ (autopublicado)

Quando um projeto é bastante pessoal, ele corre o risco de não conseguir transmitir a essência de sua ideia e, no final, a obra se torna bastante egocêntrica. No caso do emocionante “Life is Elsewhere”, do indiano Sohrab Hura, a ideia é transmitida de forma doce e carinhosa. No livro ele registra o dia a dia de sua mãe, que foi diagnosticada com esquizofrenia e paranoia. Ao mesmo tempo que sua mãe começa a esquecer as lembranças, o fotógrafo usa imagens e textos para guardar para sempre as suas próprias memórias.

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Sem ser literal nem poético só para soar sofisticado, ‘Cabanagem’ é um marco na fotografia brasileira https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2015/12/20/sem-ser-literal-nem-poetico-so-para-soar-sofisticado-cabanagem-e-um-marco-na-fotografia-brasileira/ https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2015/12/20/sem-ser-literal-nem-poetico-so-para-soar-sofisticado-cabanagem-e-um-marco-na-fotografia-brasileira/#respond Sun, 20 Dec 2015 11:55:08 +0000 https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/files/2015/12/73_104-cabanagembook-0011-180x129.jpg http://entretempos.blogfolha.uol.com.br/?p=16888 O texto abaixo foi publicado na seção Ponto Crítico da edição deste domingo (20) da “Ilustríssima”.

Já faz alguns anos, a fotografia contemporânea foi dominada por um vale-tudo em que sensações são sugeridas aos montes, situações são despejadas sem explicações e pouco é dito com contundência. Na tentativa de afastar a fotografia da ideia de que este é o suporte que mais se aproxima do registro da realidade, artistas mergulharam em quebra-cabeças de insinuações, muitas vezes resolvidos apenas em suas próprias cabeças.

No Brasil, essa tendência ganhou força com a geração nascida no fim dos anos 1980. Sem precisar conviver com questões políticas relativas ao contexto do regime militar e em ligação direta com o que vinha sendo produzido fora do país, esses novos fotógrafos desaguaram em temas da vida íntima: a transição entre infância e adolescência, a relação com a perda de familiares ou, algo muito comum, interrogações sobre identidade –sobretudo gêneros e orientações sexuais.

Embora alguns desses trabalhos tenham extrapolado a barreira do umbigo e sintetizado sentimentos particulares de maneira universal, a maioria das obras é inofensiva e parece girar em falso, sem grandes consequências ou sem gerar maiores reflexões. Já assuntos relacionados a política ou a questões nacionais foram relegados à fotografia documental, quase sempre realizada como um registro cru e jornalístico dos fatos.

Há, no entanto, uma quebra nessa narrativa. Impulsionado pelas manifestações que varreram o país em 2013, o fotógrafo paulistano André Penteado buscou elaborar uma representação que servisse de contraposição à imagem do brasileiro como povo cordial.

Mas, em vez de retratar os protestos recentes, voltou-se para a Cabanagem, revolta popular no século 19 em que índios, negros e mestiços tomaram o poder na então província do Grão-Pará. Ainda assim, “Cabanagem” [Editora Madalena, 208 págs., R$ 150] não é um resgate histórico, mas uma investigação, no Estado do Pará, dos traços da rebelião que permanecem na identidade brasileira: violência, religião e burocracia.

Mesmo que o leitor não saiba sobre o que este fotolivro discorre, a sequência pensada para as imagens leva o olhar a um percurso sombrio, permeado de uma sensação incômoda. Penteado insinua, mas o faz com contundência. Oferece pistas sem fazer jogos ingênuos que não levam a lugar algum.

A obra, dividida em três livros reunidos num envelope de repartição pública, abre com imagens de uma natureza ainda bela, idealizada, mas que aos poucos vai se tornando pesada, até cair em fotografias de santos quebrados, rachaduras de uma Belém desgastada, gavetas de arquivos abandonados e reproduções de jornais que mostram assassinatos –tão brutais que, muitas vezes, é preciso “pixelizar” o corpo do morto por inteiro.

A sequência das imagens, pensada matematicamente, acumula camadas históricas numa espiral que fica se repetindo sobre o mesmo lugar –sem que isso seja entediante, tamanho o fôlego da obra. Depois de compreender as motivações do trabalho –o livro ainda traz um encarte com texto da historiadora Magda Ricci sobre a Cabanagem–, é possível perceber o país como um lugar onde tudo é improvisado e com algo por fazer.

Se no livro de capa verde, que ancora “Cabanagem”, Penteado não mostra nenhum rosto, o livro de capa vermelha é composto somente por retratos. O artista documenta personagens com alguma ligação ou referência à revolta. Sem que precisem ser literais, tampouco poéticos só para parecer sofisticados, os livros que formam “Cabanagem” chegam a um equilíbrio raro no registro de questões políticas e de identidade nacional.

É curioso lembrar que, antes de lançar esta obra, Penteado ficou conhecido por um ensaio sobre o suicídio de seu pai. Numa combinação entre fotografia e performance, ele vestiu as roupas do genitor e realizou autorretratos. Embora o passo anterior seja interessante, Penteado chega a um outro nível –muito mais elevado. “Cabanagem” é um marco na fotografia brasileira.

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Ponto crítico: ‘Ramos’ https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2015/11/09/ponto-critico-ramos/ https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2015/11/09/ponto-critico-ramos/#respond Mon, 09 Nov 2015 17:47:13 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://entretempos.blogfolha.uol.com.br/?p=16341 À convite da “Ilustríssima”, uma das metades do blog escreveu mais uma vez sobre “Ramos”, de Julio Bittencourt. A crítica foi publicada neste domingo.

Em frente à câmera ninguém é inocente. Quando alguém percebe que está sendo fotografado, torna-se ator. No piscinão de Ramos, praia artificial na zona norte do Rio, esse espetáculo é feito de litros de descolorante, boias e formas generosas, que transbordam de sungas e biquínis diminutos.

“A praia é um parque de diversões”, escreveu o fotógrafo britânico Martin Parr no texto que acompanha “Ramos”, de Julio Bittencourt, ensaio lançado agora como fotolivro [Cosac Naify e editora Madalena, 80 págs., R$ 80].

Corpos esbeltos e outros nem tanto se divertem em piqueniques, rodas de fofoca e nas horas gastas em busca do bronzeado perfeito. No piscinão do subúrbio carioca, mas principalmente nas tintas pesadas de Bittencourt, a praia ganha ares ainda mais folclóricos. Numa das cenas, enquanto o blondor escorre pelo corpo de uma garota de biquíni com estampa de flores, o desenho do Cristo Redentor abre os braços em uma toalha estendida sobre a areia escura, na qual ainda repousa uma garrafa de refrigerante Convenção.

Em outra, uma mulher de costas, também com descolorante, está bem no centro de uma página dupla, o que escancara um grave problema de encadernação para uma publicação de fotografia. As folhas não abrem por inteiro, e muitas vezes é preciso forçar a obra para ver as imagens com clareza. Trata-se de uma falha frequente nos fotolivros brasileiros.

Publicado pela primeira vez há seis anos, o ensaio do fotógrafo paulista ganhou prêmios e rodou exposições mas também despertou críticas. Há muitos que condenam esse tipo de abordagem sobre camadas populares, que traria um olhar sarcástico de superioridade sobre seus personagens.

A influência da linguagem consagrada por Martin Parr, que declarou sua admiração pelo trabalho de Bittencourt, é inegável. Nas fotografias do artista britânico, porém, as críticas ao comportamento consumista da classe média vem banhado em um humor corrosivo, mas ainda assim sutil.

O artista paulista deixa a leveza escapar na edição posterior à realização das imagens. Confere às fotos um tratamento de cor pesado, que dá ao ensaio um visual forçado. Embora Bittencourt não priorize o absurdo –o espetáculo da praia está ali por si só–, os tons sombrios acabam por reforçar a estética do excêntrico. É uma contraposição à captação das imagens.

Durante todo o livro, não se vê a busca pelo bizarro. Quem for até o piscinão de Ramos certamente encontrará os elementos retratados pelo fotógrafo em abundância, e não como uma exceção. Ele também trata seus personagens com respeito. Em muitas fotos, opta por esconder os rostos –importa o espírito coletivo do que retrata, e não a personificação. Quando é inevitável revelar expressões, o faz com consentimento dos retratados –alguns deles claramente posaram para Bittencourt.

Mais: em lugares públicos como esta praia artificial, que concentram grande fluxo de pessoas ao mesmo tempo, não há como ser totalmente honesto, justo ou qualquer outro adjetivo que satisfaça a sanha do politicamente correto. Talvez quem critique essa abordagem acredite que ser flagrado usando blondor, tomando cerveja, comendo farofa ou com areia grudada nas costas seja um demérito.

“Ramos” vem na esteira de obras da fotografia brasileira contemporânea relançadas em formato de fotolivro. Assim como o ensaio de Bittencourt, são exemplos desse movimento “Ninguém É de Ninguém”, de Rogério Reis, e “Aeroporto”, de Cássio Vasconcellos, além do já publicado “Albinos”, do mineiro Gustavo Lacerda.

O fotolivro finalmente se consolida no país como a forma mais completa de expressão para fotógrafos. Não se trata apenas de enfileirar fotografias. É preciso uma narrativa que conduza o leitor a partir de uma estrutura coerente. É assim no cinema, é assim na literatura, é assim na fotografia.

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‘Ramos’, de Julio Bittencourt https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2015/09/16/ramos-de-julio-bittencourt/ https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2015/09/16/ramos-de-julio-bittencourt/#comments Wed, 16 Sep 2015 15:52:46 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://entretempos.blogfolha.uol.com.br/?p=15957
Fotos: Eduardo Knapp/Folhapress

‘Ramos’, de Julio Bittencourt (Cosac Naify e Editora Madalena) – É curioso como trabalhos importantes da fotografia brasileira publicados há alguns anos vêm sendo relançados como fotolivros. Ocorreu dessa forma com “Albinos”, de Gustavo Lacerda, ganhador do Conrado Wessel em 2011 e publicado no ano passado pela editora Madalena, e ocorrerá da mesma maneira com “Ninguém É de Ninguém”, de Rogério Reis, prestes a virar livro pela edições Olhavê. “Ramos”, de Julio Bittencourt, segue essa trajetória.
Em 2009, o ensaio sobre o piscinão de Ramos, no Rio, começou a aparecer com frequência na imprensa e logo conquistou o prêmio Porto Seguro de Fotografia. Agora, por meio de uma parceria entre Cosac Naify e editora Madalena, a série feita de tintas sarcásticas e de formas generosas que transbordam de biquínis e sungas torna-se livro. Enquanto o blondor escorre pelas páginas, e um sem número de corpos suados desfilam, a capa estampa letras douradas –bem no estilo ostentação. É um acerto do projeto gráfico –de ótima qualidade de impressão–, embora carregue o pesadelo constante das publicações brasileiras: as páginas não abrem por inteiro, e é preciso forçar o livro para ver as fotos. No pior caso, a imagem de uma mulher de costas, com litros de bronzeador e usando fio-dental, está exatamente no centro de uma página dupla. O registro virou qualquer outra coisa que não a foto pensada pelo artista –parece que a personagem fez uma lipoaspiração. Se as imagens remetem à acidez e à temática da obra de Martin Parr, a referência é declarada. O próprio britânico escreve o texto do livro, no qual coloca Bittencourt entre os dois fotógrafos de praia que o impressionou. Há muitos que reclamam desse tipo de abordagem sobre camadas populares, que traria um olhar supostamente de superioridade sobre os retratados. Discordo. Em várias imagens, Bittencourt opta por esconder os rostos. Em outras, é inevitável não mostrar suas expressões. Quando feitas com consentimento dos personagens, as fotos me parecem ainda mais justas. Além disso, em lugares públicos como o piscinão, não vejo como ser completamente honesto, justo ou qualquer outro adjetivo que contemple a sanha do politicamente correto. Talvez quem critique essa abordagem acredite que ser flagrado com blondor, comendo farofa ou dando uns malhos na areia diminua alguém.

Avaliação: bom 

Haikai: em críticas curtas, o blog comenta fotolivros lançados neste ano.

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Lucas Lenci exclui protagonismo das paisagens para se centrar no humano https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2015/08/11/lucas-lenci-exclui-protagonismo-das-paisagens-para-se-centrar-no-humano/ https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2015/08/11/lucas-lenci-exclui-protagonismo-das-paisagens-para-se-centrar-no-humano/#comments Tue, 11 Aug 2015 20:41:06 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://entretempos.blogfolha.uol.com.br/?p=15223

Há dois anos, quando Lucas Lenci lançou o fotolivro “Desaudio”, as imagens do paulistano exibiam paisagens calmas e monumentais. A presença humana, destacada em uma fotografia ou outra, aparecia sempre como coadjuvante.

Agora, na exposição e livreto que o fotógrafo lança nesta terça-feira (11), suas atenções recaem sobre como o homem interage com o ambiente que habita e como nossas atitudes interferem na evolução de cada um. Para isso, produziu registros que tivessem elementos cortando as imagens e dividindo-as em dois.

É como se Lenci tivesse demarcado os territórios de acordo com os espaços escolhidos por seus personagens. Num zoológico, dez pessoas observam um animal invisível no quadro, ao mesmo tempo em que a jaula do bicho parece encarcerar os espectadores da cena. Em outra imagem, um homem aparece fazendo palavras cruzadas rodeado pela vegetação de um parque em Chicago.

No caminho contrário às imagens coloridas, o paulistano ainda trabalha sobre o espaço com uma série de composições em que empilha panorâmicas em preto e branco, como se brincasse com a tradição da fotografia de rua.

“Hominini”, como o trabalho foi batizado, refere-se a uma tribo de primatas que inclui chimpanzés e o próprio homem. Mas, embora o nome faça ilusão a algo grandioso, como se tratasse da evolução da espécie “desde que a Terra é Terra”, o fotógrafo diz que seu tema é o progresso do comportamento humano no nível diário. Contribuiu para isso o nascimento de sua segunda filha, pela qual foi possível traçar um paralelo com atitudes tomadas no cotidiano.

“Filhos mudam totalmente sua perspectiva. Você começa a ver que toda a fichinha que coloca neles, todo dia, toda hora, vai contribuir para aquilo que eles serão”, derrete-se Lenci. “Estou no segundo, mas todo dia é como se fosse um filho novo.” Se as imagens em “Desaudio” eram centradas em horizontes de uma maneira quase impessoal, outra mudança na abordagem do fotógrafo neste trabalho é a inclusão de imagens que fazem parte de sua vida íntima.

O que antes era tratado como tabu ainda não foi quebrado por completo, mas Lenci passou a usar fotos de seus filhos na série agora exposta. Essa “barreira mental”, como ele define, só não foi derrubada por receio de sua mulher, que se sentiu desconfortável com a inclusão de uma imagem em que sua filha tomava banho de luz na maternidade observada pelo filho de um amigo.

Embora o registro esteja na exposição, ela não foi parar no livreto de 16 páginas, que vem dentro de um envelope com mais 14 fotografias soltas.
“No ambiente da galeria, você controla tudo. A foto está exposta para contar a história, as pessoas vêm, entendem e tudo bem”, explica o fotógrafo.

“Mas no livro, ainda mais sendo uma lâmina solta, cai um pouco na vida. Como artista, não me incomodo, mas sou casado e tenho que administrar a censura domiciliar”, continua ele, com bom humor. “Minha mulher demostrou desconforto e a gente teve que… Tudo bem. Mas, sinceramente, esquecendo que sou pai, usando o chapéu de artista, a mensagem é muito mais importante do que a criança que está lá. Infelizmente, ou felizmente,
sei lá, a gente trabalha com o mundo real, com o tudo que está lá.”

“Hominini” marca também a estreia da série “Pequenos Formatos”, publicado pela editora Madalena. Na feira SP-Arte/Foto, entre os dias 20 e 23 de agosto, outras publicações da série estarão disponíveis para venda. Além de Lenci, há exemplares de Claudia Jaguaribe e do uruguaio Christian Rodriguez.

HOMININI
ARTISTA Lucas Lenci
QUANDO
abertura na terça (11), às 18h, de segunda a sexta, das 10h às 19h, sábado, apenas por meio de agendamento; até 4/9
ONDE
Galeria ArtEEdições, r. Estados Unidos, 1162, tel. (11) 3031-0142
QUANTO
grátis

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‘A Grande Seca’, de Ronald Ansbach https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2015/07/29/a-grande-seca-de-ronald-ansbach-2/ https://entretempos.blogfolha.uol.com.br/2015/07/29/a-grande-seca-de-ronald-ansbach-2/#respond Wed, 29 Jul 2015 21:00:59 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://entretempos.blogfolha.uol.com.br/?p=14798
Fotos: Eduardo Knapp/Folhapress

“A Grande Seca”, de Ronald Ansbach (Editora Madalena) –
Dá dó abrir a embalagem do fotolivro de Ronald Ansbach. Embrulhada à vácuo, a publicação é um objeto muito curioso, daqueles que dá vontade de ter dois exemplares: um para manter sua concepção intacta, e outro para a leitura. Embora o título do trabalho faça relação com a atual crise da água em São Paulo, seu sentido é mais amplo, e engloba –por meio de antagonismos– muitas outras características da capital paulista. Assim, em vez do trânsito caótico, quase não se vê carros em movimento; em vez do mar de gente que circula todos os dias pela cidade, não há ninguém transitando pelas ruas.
Os registros concentram esse silêncio monumental de edifícios e concreto. Mas o que poderia ser mais uma série sobre as mesmas questões sobre São Paulo foi salvo pela forma como a publicação foi estruturada, proporcionando novas possibilidades de encaixe entre as imagens. Com o mesmo raciocínio de “(based on a true story)”, fotolivro do americano David Alan Harvey, cujas páginas foram publicadas soltas, “A Grande Seca” também mistura paisagens. É um jogo muito interessante, com combinações espertas e outras um tanto óbvias. Nesse ponto, a obra de Harvey, com fotografias do Rio completamente diferentes entre si, causa um impacto maior, pois suas conexões são milagrosas. Já no livro de Ansbach, na maioria das vezes, rua encaixa com rua, prédio encaixa com prédio, parede encaixa com parede. Ainda assim, a obra é uma síntese muito bonita sobre como São Paulo é um lugar construído sem nenhum planejamento urbano, onde casas e prédios se encavalam sem sentido, além do acabamento editorial primoroso.

Avaliação: bom 

Haikai: em críticas curtas, o blog comenta fotolivros lançados neste ano.

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