Fotografia Print Screen
Reproduzimos aqui o texto publicado na capa do caderno Tec, da Folha, em que uma das metades do Entretempos escreveu sobre pós-fotografia.
Amanhã, o blog coloca aqui a entrevista completa com o catalão Roc Herms, que documenta o entorno virtual da plataforma “Playstation Home”, similar ao Second Life.
Vai lá!
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Capturas de tela e ferramentas da internet reinventam forma de fotografar
Quando o fotógrafo alemão Michael Wolf se mudou de Hong Kong para Paris, ele se sentiu infeliz.
Após 16 anos vivendo no continente asiático, nada poderia ser mais tedioso do que fotografar a capital francesa.
Retratada à exaustão, Paris havia se tornado uma repetição de clichês até Wolf inventar uma maneira diferente de olhar para a cidade.
Sem sair de casa, com uma câmera e um tripé, o alemão passou a fotografar as telas de seu computador em que Paris era exibida a partir do Google Street View.
Ao cortar e reinterpretar cenas cotidianas captadas pelo carro do Google, Wolf ajudou a recriar a fotografia de rua.
Flagras de uma mulher urinando atrás de um carro, um furgão pegando fogo e uma senhora que caiu na calçada foram algumas das paisagens que lhe renderam, em 2011, a menção honrosa do World Press Photo, maior prêmio do fotojornalismo mundial.
“A New American Picture”, de Doug Rickard. Série foi comparada ao trabalho de Walker Evans
Os pixels de “A Series of Unfortunate Events” (Uma Série de Eventos Infelizes) geraram, ao mesmo tempo, enorme polêmica entre os setores mais conservadores da fotografia e a descoberta de um mundo não explorado.
A invenção de Wolf faz parte de um grupo de artistas que estabeleceu uma nova abordagem para criar figuras. Batizada de pós-fotografia, a tônica da produção se concentra na edição, reinterpretação e no remix de imagens já existentes e espalhadas pela web.
Paralelamente ao alemão, outros artistas utilizaram o recurso de mapas do Google para documentar espaços marginais das cidades.
O fotógrafo Doug Rickard registrou os subúrbios americanos, enquanto o belga Mishka Henner documentou, em “No Man’s Land”, fronteiras da Europa onde prostitutas oferecem serviços na rua.
Foto de Jon Rafman, parte do projeto “9-eyes”, pioneiro na captura de telas do Street View
A série foi finalista na última edição do importante prêmio Deutsche Börse Photography, que valoriza as principais contribuições para a fotografia europeia.
A pós-fotografia, porém, reacendeu discussões em torno da autoria de cliques compartilhados na internet. Há, ainda, críticas quanto a considerar reproduções de tela como trabalhos fotográficos.
O americano Constant Dullaart, que distorce símbolos da tecnologia em performances e instalações, defende o processo. “Estou interessado em analisar como observamos as coisas e o que influenciou isso. Pode ser o Google ou como uma cidade é construída”, explica o artista.
Se o conceito de fotografia foi tradicionalmente consolidado na ideia de escrever com luz, as novas produções são construídas a partir do processamento de algoritmos, sem o uso de câmeras.
ATLAS
Pouco antes de cometer suicídio, o cocriador das atualizações via RSS, Aaron Swartz, desenvolveu ao lado da americana Taryn Simon o projeto “Image Atlas”. O trabalho compara as diferenças e similaridades dos resultados de buscadores de imagem dependendo do país de onde parte a pesquisa.
Ao procurar pelo termo “sexo”, por exemplo, o retorno destoa drasticamente. Há a imagem de um crucifixo na busca correspondente à Síria, e a foto de uma mulher com dois homens no resultado na França. Já na Coreia do Norte o resultado é vazio, e no Egito aparecem mapas.
Tanto o “Image Atlas” quanto os projetos que utilizam o Google Street View estão inseridos na “Found Photography”, categoria baseada na reutilização de fotos perdidas ou descartadas por seus autores originais.
Se esse recurso é antigo, as conexões com ferramentas on-line deram novo significado à prática, apontando reflexões sobre como lidamos com símbolos comuns do cotidiano da tecnologia.
Em março, em Barcelona, a exposição “From Here On” reuniu os principais trabalhos da pós-fotografia.
A mostra aconteceu a partir do manifesto elaborado durante o festival de fotografia de Arles, na França –com participação de Clement Cheroux, curador do Pompidou, e Martin Parr, fotógrafo da lendária agência Magnum.
OFF-LINE E ON-LINE
Para entender a construção de descansos de tela de aparelhos de DVD e as bolinhas animadas do carregamento de vídeos do YouTube, o americano Constant Dullaart simulou na vida real os mesmos movimentos das representações virtuais.
Com recortes de papel e até fogo, o artista reproduz símbolos da tecnologia em escala humana.
“Comecei a me perguntar quem projetou a animação do YouTube, e se eles perceberam o quanto isso seria visto, o quanto iria significar na vida das pessoas. Então, passei a copiar e reestruturar esses tipos de marcas, olhando para as diferentes formas de observar nosso mundo virtual”, explica Dullaart em entrevista, claro, por e-mail.
“Antes de existir a internet, as pessoas queriam estar na televisão ou no jornal. Agora, você quer ser capaz de criar um meme, ou fazer parte de um. Eu gostaria de enfatizar a materialidade de um meio que se faz tão virtual”, descreve.
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