Azul é a cor mais bela

DAIGO OLIVA

O texto a seguir contém centenas de spoilers. Caso você ainda não tenha assistido ao longa “Azul é a Cor Mais Quente”, não leia nada e vá ao cinema.

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Só a taradice descontrolada e um espírito de 5º série explicam a obsessão coletiva com a cena de sexo explícito de “Azul É a Cor Mais Quente”.

Pouco importa se são 7 minutos de lesbianismo, se usaram vulvas de silicone para gravar, se alguns consideram a passagem longa demais ou se houve quem tivesse vontade de rir. Irrelevante. Centrar o filme de Abdellatif Kechiche em discussões sobre uma cena de sexo entre duas mulheres é ignorar aspectos muito mais significativos da obra.

Assim como não faz sentido insistir no debate de que “Azul”, embora retrate uma relação homossexual, trata do amor em um sentido mais universal –seja lá o que isso for. Já me convenci de que apenas mulheres que passaram pela mesma descoberta da protagonista em relação a sua sexualidade –e os psicanalistas– podem responder a essa pergunta.

O que resta então? Além da boca surreal de Exarchopoulos, aberta e rasgada nos cantos cada vez que sorri, há passagens sutis que superam o eixo principal do filme. A agressividade com que Adèle come macarronadas e ostras é tão sexual quanto os momentos com Emma. “Azul” é um filme oral que não poderia ser falado em outra língua se não o francês.

Macarronadas e ostras que, preparadas por famílias estereotipadas, escorregam em perfis liberais e conservadores. Como se alguns preconceitos estivessem restritos apenas a um nível sócio econômico e/ou cultural… Ainda assim, é apenas um pequeno deslize. O ponto realmente negativo do filme é a impressionante breguice das pinturas de Emma.

A ruindade dos quadros contrasta com a forma como Kechiche conta a descoberta do amor. No decorrer do encontro com Emma, os planos extremamente fechados no rosto de Adèle se abrem. É a descoberta.

A insistência do diretor em cenas longas durante as aulas na escola infantil e o desconforto da protagonista junto aos amigos descolados da namorada se justifica: são daqueles momentos cotidianos que, por mais sutis que sejam, perduram por dias. Assim como o embate do casal entre “você precisa fazer um trabalho autoral” e “eu só quero ser uma professora”.

São essas questões laterais, acompanhadas de uma trilha sonora fantástica –de “On Lâche Rien” a Lykke Li– que fazem de “Azul” um filme especial.

Aos que reclamaram da duração do filme, fica a máxima de Inácio Araújo ao comentar “O Som ao Redor”. “Alguém quer tirar 20 minutos do filme. Como dizia o Truffaut: que tire do seu. Por que não manda tirar 100 páginas do romance do Dostoiévski? Para com isso…”. Para com isso…

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Comentários

  1. Um filme chato e enfadonho, mal costurado e mera oportunidade para o diretor fotografar, de todos os ângulos possíveis, a bela atriz. Foi uma perda de tempo assistir.
    T. Hill

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