Alfabeto visual e cromático de William Eggleston é exibido no Rio de Janeiro

DAIGO OLIVA
“Greenwood, Mississippi”, 1973; Eggleston Artistic Trust, cortesia Cheim & Read, Nova York
Outdoors, carros e placas saltam aos olhos em registros com cores saturadas, como se fossem peças publicitárias. Refrigerantes e bombas de postos de gasolina aparecem em imagens que combinam tons vibrantes com uma certa sensação de decadência. A atmosfera do sul dos EUA nos anos 1960, de modernização e explosão do consumo, é o cenário dos ensaios do fotógrafo William Eggleston, 75, em cartaz agora no Instituto Moreira Salles do Rio.
Com 172 obras –maior mostra do artista, superando a marca de 2008 do Whitney Museum, em Nova York–, a retrospectiva contém tanto seus trabalhos pouco conhecidos quanto a polêmica série exibida no MoMA,
em 1976, quando Eggleston foi execrado pela crítica. Naquele período,
o uso das cores na fotografia era associado a banalidades, em contraste
com a imponência dos registros em preto e branco.
Hoje, Eggleston não só é reconhecido como pioneiro, como puxa a fila de outros nomes que se arriscaram nessa transição, como o italiano Luigi Ghirri e os americanos Stephen Shore e Saul Leiter. Para Thyago Nogueira, curador da mostra, a utilização da técnica de impressão dye-transfer, que deixa as cores mais saturadas, foi um dos diferenciais do americano.”
Ele ainda fazia enquadramentos dramáticos, como narrativas interrompidas. Isso deixava o trabalho mais misterioso”, diz Nogueira. A mostra também apresenta o portfólio “Los Alamos”, produzido nas décadas de 1960 e 70,
mas publicado apenas nos anos 2000. Em quadros mais fechados, Eggleston produz um alfabeto visual a partir de elementos da vida americana daquela época. Ali, cores vívidas de roupas, letreiros e objetos se contrapõem à obsolescência de seus materiais –manchas, ferrugens e corrosões tomam
as fotos, numa crítica inconsciente ao consumo.
Imagem da série “Los Alamos”; Eggleston Artistic Trust, cortesia Cheim & Read, Nova York
Outra contraposição é a presença de cinco imagens em preto e branco na mostra. Embora as fotos também registrem o crescimento das cidades, elas são documentos singulares de um fotógrafo marcado pelas cores, que voltam em outra série pouco conhecida de retratos feitos com câmera de grande formato. Uma das imagens de Eggleston, de uma lâmpada opaca sobre um fundo vermelho, foi usada na capa de “Radio City”, disco do Big Star, banda de rock dos EUA liderada por Alex Chilton, de quem Eggleston era próximo.
A parceria mostra a relação do fotógrafo com a música –além de pianista, fez capas de álbuns das bandas Primal Scream e Jimmy Eat World. Mas é com David Byrne, ex-Talking Heads, que o artista alimenta forte amizade –desde quando Eggleston colaborou para o livro “True Stories”, de autoria do britânico. À Folha, por e-mail, o músico não relaciona Eggleston ao rock.
“Ele toca Bach e faz improvisações como Bach. Quando apareceu com fotos em preto e branco, foi considerado erudito. Mas o que ele fez foi pegar um meio tachado de baixa qualidade e mostrar que poderia ser tão erudito
quanto qualquer outro.” É a mesma opinião de Thyago Nogueira, para
quem a sofisticação de Eggleston se traveste de kitsch. “Ele está desde a
foto do jantar no Instagram aos lugares vazios. Desde o pop da foto da
Coca-Cola aos registros conceituais. Ele resume todo o mundo.”

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