Fotógrafo britânico Sebastian Palmer registra rostos da cracolândia em SP

DAIGO OLIVA

Num fundo neutro e com o enquadramento de fotos 3×4, o fotógrafo inglês Sebastian Palmer, 36, quis “humanizar” os usuários de drogas da cracolândia.

Diferente das imagens que exibem o centro de São Paulo como pano de fundo, o britânico excluiu qualquer tipo de contexto para se concentrar no registro das pessoas que ocupam a região. “Queria minimizar distrações e fazer com que os leitores ficassem cara a cara com os retratados. Lembrassem que, além de usuários, eles também são seres humanos”, explica o britânico, que fotografou cerca de 50 pessoas no projeto “Ghosts” (fantasmas).

Palmer vive entre Londres e São Paulo, onde veio pela primeira vez em 2012 para uma palestra. Desde então, voltou ao país várias vezes para desenvolver ensaios que documentam “setores marginalizados da sociedade brasileira”, como uma série sobre prostitutas transexuais.

Na cracolândia, ele contou com a ajuda do programa De Braços Abertos, da prefeitura, que ofereceu o contato de um ex-usuário de crack para introduzi-lo na região. Mas a principal companheira do fotógrafo foi a brasileira Joana Pires, 34, que o auxilia desde os primeiros projetos no país.

Sem falar português fluente –ele diz apenas entender o idioma–, o britânico recorreu à produtora para abordar e conversar com os retratados enquanto produzia as imagens. Antes, durante dias, eles percorreram a área sem equipamentos apenas para se ambientarem.

“Quando você chega com uma câmera fica difícil, e o Sebastian queria montar um miniestúdio. É uma situação que assusta muito. Por isso, o trabalho preparatório foi importante”, conta Joana. Sempre na parte da manhã, “antes que os usuários ficassem muito agitados, sem parar de se mexer”, a dupla fotografava as pessoas. Eles garantem que nenhum deles pediu dinheiro ou algo em troca. Mesmo assim, entregavam o retrato feito caso encontrassem um dos participantes do projeto em uma nova oportunidade.

Medo não foi uma sensação relatada nem pelo fotógrafo nem pela produtora. Enquanto Palmer diz que a atmosfera era intensa, mas sempre amigável, a brasileira relembra que os assuntos citados durante as fotos faziam com que a tristeza predominasse sobre o medo.

“Abusos sexuais, mentais, assassinatos, roubos, prostituição, perdas na família e alcoolismo eram temas de todos os depoimentos”, conta Palmer. Joana ainda guarda a história de um menino que teria começado a usar
crack aos sete anos e uma senhora que elegeu o Dia das Mães como sua
data preferida no ano. Ironicamente, ela disse não ter filhos e que teria feito diversos abortos. “Ninguém está nessa situação porque quer. E o fato
de eles estarem nesta situação não significa que podemos desrespeita-los
ou fingir que não existem”, defende Palmer.

“Se ao menos uma pessoa prestar a atenção ao que está acontecendo e mudar sua ideia sobre o tema, quer dizer que estamos na direção correta.”

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