‘Sobre Marinhos’, de Gilvan Barreto

DAIGO OLIVA

“Sobre Marinhos”, de Gilvan Barreto (autopublicado) – “Sobre Marinhos”, do pernambucano Gilvan Barreto, faz parte de uma trilogia de fotolivros iniciada em 2012 com o lançamento de “Moscouzinho”. Um ano depois, ele publicou “O Livro do Sol”, também pela editora Tempo d’Imagem. Enquanto o primeiro título fala sobre investigações de suas origens e a relação com o pai, a obra seguinte trata da presença do homem e da água no sertão nordestino. Agora, Gilvan fala com mais atenção sobre o vínculo entre homem e natureza, com páginas que se desdobram e simulam o movimento do mar. Além do “ciclo da vida”, tema que o próprio fotógrafo indica como elo entre os três trabalhos, há também uma forte ligação estética, principalmente entre “Moscouzinho” e o livro lançado agora. Goste-se ou não, há coerência na forma como Gilvan registra seus assuntos. O que chama mais a atenção, porém, é que, diferente dos títulos anteriores, “Sobre Marinhos” peca pelo acabamento. Trato aqui do livro como objeto –não falo de seu conteúdo fotográfico, ao menos por enquanto. É difícil entender a combinação de materiais: um papel verde mais grosso é recoberto por duas chapas de cartão Paraná na capa e na contracapa. A encadernação é feita com dois parafusos, o que faz com que a publicação fique desajeitada, pois o peso não está estruturado conforme seu projeto. É bem diferente dos parafusos de “Campo Cego”, fotolivro de Ivan Padovani, no qual o acabamento é primoroso. Para iniciar a leitura de “Sobre Marinhos” é preciso abrir um pequeno velcro circular, que dá certo tom escolar ao livro –um detalhe que não acrescenta nada ao trabalho. Nas imagens, Gilvan recorre a diferentes suportes, como já havia feito em outros trabalhos. Além de fotografia, há também colagens e uso de linhas de costura. Embora o desdobramento das páginas proponha o desenho das ondas, é também um movimento repetitivo e, ao final, maçante. Para algumas sequências funciona, para outras, não.

Avaliação: ruim

Haikai: em críticas curtas, o blog comenta fotolivros lançados neste ano.

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Comentários

  1. A crítica a uma obra não pode se basear tão somente nos aspectos formais ou ao seu suporte. Há, em “Sobre Marinhos”, o desenvolvimento de uma narrativa onírica que surge a partir da articulação original e bem construída entre a literatura de Albert Camus (O Estrangeiro) e as reminiscências do fotógrafo, sua relação com o mar, o medo, o desejo. É de extrema beleza, por exemplo, a forma como Gilvan cria paisagens que se deslocam da citação ao texto e se materializam em imagens complexas e universalizantes. Suas estratégias poéticas são originais e escapam ao óbvio. Consegue, de fato, um mergulho profundo num mar de referências e auto citações.
    Se o livro peca ao não ter um acabamento primoroso, ainda há que se ressaltar o projeto que optou por correr riscos no agitado mar das possibilidades gráficas, no intuito de conseguir materializar o conceito da obra, ao invés de navegar por águas tranquilas.
    Não se deve relevar que a obra foi realizada com recursos de um edital público (verba minguada para esse tipo de publicação) e que possui distribuição gratuita.
    Resumindo, não acho justo criticar uma obra se não for para refletir sobre seu conteúdo e sua forma, sobre seus pressupostos e sua elaboração, suas estratégias poéticas e seu lugar no mundo hoje. Eleger apenas um desses aspectos em detrimento de outros incorre no perigo de jogar a criança fora junto com a água suja da bacia.

    1. Boa, Eder. Entendo seus pontos, mas discordo sobre a abordagem dos temas feita pelo fotógrafo. Porém, essa é uma opinião muito pessoal minha, que pode ser interpretada como pegação no pé. Por isso, neste pequeno texto, ative-me apenas a aspectos objetivos da publicação. E volto a dizer: um fotolivro deve ter a mesma preocupação com design, escolha de materiais e acabamento do que com o seu conteúdo fotográfico. Ele é um objeto completo. Como é possível perceber pelo pouquíssimo que trato do conteúdo na crítica, fica claro que não gosto da parte fotográfica, mas isso é a minha compreensão, a minha interpretação do trabalho. Se eu gosto ou não, neste caso, pouco importa. O que importa é a parte objetiva. O livro tem acabamento precário, foi estruturado de maneira ruim, o design não potencializa a obra.

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