Segredo da fotografia do novo ‘Mad Max’ é guiar olhos do espectador pela ação sem deixá-lo zonzo

DAIGO OLIVA

Puristas vão odiar, mas “Mad Max: Estrada da Fúria” não foi feito para eles. Quem gostou das cores artificiais do longa, lançado 30 anos após a terceira parte da franquia, sabe que um filme assim só pode ser feito graças a um grande esforço de pós-produção. A intensidade do laranja arenoso nas cenas filmadas durante o dia e o gélido azul do trecho noturno são frutos de muitos algoritmos. O próprio cinematógrafo do longa, o premiado John Seale, comentou ao site “Hitfix” que a preocupação nas filmagens era, mais do que tudo, o posicionamento das muitas câmeras.

Em um filme de ação com cortes rápidos como”Mad Max”, faz sentido se preocupar essencialmente em produzir quantidade significativa de opções para a edição. O diretor, George Miller, sabia que correções de cor e outras imperfeições poderiam ser feitas digitalmente. Mas, mesmo que o longa seja uma experiência visual inacreditável, este processo não surpreende. Quais seriam então os segredos da direção de fotografia que levaram o filme a ser indicado ao Oscar na categoria?

Em 99% das tomadas, o assunto principal da cena está bem no meio da tela, pois Miller quer que o espectador não tenha tempo de procurar onde está a ação. Como o filme é recortado em trechos que duram um piscar de olhos, “Estrada da Fúria” ganha ritmo alucinante sem deixar ninguém zonzo. Isso é essencial, uma vez que o roteiro deve ter no máximo meia página –na verdade não tinha, eram só storyboards– e tudo se desenvolve numa sucessão de perseguições longuíssimas. O quarto episódio da franquia não é um filme de teorias e diálogos elaborados sobre um mundo pós-apocalíptico, mas um fiapo de história para ver e não pensar muito. Às vezes isso é muito bom.

O site “VashiVisuals” compilou sequências que demonstram o ponto de foco central na grande maioria das 2700 cenas que compõem o filme. É incrível quando um “truque” como este passa imperceptível durante a sessão, mas é claramente entendido pelo cérebro. Nesse caso, sem os enquadramentos realizados dessa maneira, “Mad Max” não teria esta edição poderosa e frenética.

Por isso, é compreensível que o longa tenha sido lembrado em tantas categorias técnicas –edição, direção de arte, figurino, efeitos visuais, maquiagem, edição de som e mixagem de som, além de fotografia– ao mesmo tempo em que foi ignorado nas indicações de atuação –o que, caso ocorresse, seria um absurdo. A força de “Mad Max” está na capacidade de imaginação de cenários, veículos e roupas tão deslumbrantes quanto os exibidos na tela. É curioso que Seale, vencedor do Oscar em 1997 pela fotografia de “O Paciente Inglês”, não esconda quem é o responsável pela criação estética do filme: George Miller. Em pré-produção durante 12 anos, “Mad Max” já tinha seu visual concebido na cabeça do diretor bem antes do cinematógrafo australiano entrar na produção.

Com o anúncio dos prêmios dos sindicatos dos diretores e dos cinematógrafos, fica claro que o caminho do Oscar está aberto para “O Regresso”. Uma pena. Seria interessante se ao menos Miller, que transitou entre filmes tão distintos quanto “Happy Feet” e “Babe, o Porquinho Atrapalhado”, vencesse a estatueta. A história sofrida do personagem de Leonardo DiCaprio vai passar, mas a saga de um mundo destruído e insano como o de “Mad Max” seguirá viva na cabeça de muitos –algo que ocorre desde a década de 1980. Poucos conseguiram criar uma referência estética que é copiada e reverenciada em todo o mundo, de filmes a festas à fantasia. Miller conseguiu.

A cerimônia do Oscar ocorre na noite do dia 28, em Los Angeles. Junto a “Mad Max”, concorrem a melhor direção de fotografia os filmes “O Regresso” e “Carol”, ambos já comentados no blog, além de “Sicario” e “Os Oito Odiados”. Falaremos sobre os dois últimos até a data do prêmio.

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