Concepção gráfica coerente é ponto alto de ‘Hart’, fotolivro de Laura Del Rey e Alziro Barbosa

DAIGO OLIVA

‘Hart’, de Laura Del Rey e Alziro Barbosa – Se alguém que não está muito familiarizado com o universo dos fotolivros me perguntasse como se faz um livro de fotografia, eu certamente incluiria na resposta o vídeo no qual Laura Del Rey explica a produção de “Hart”. A fala da brasileira que foi a Madri estudar produção de fotolivros na escola Blankpaper é didática, sem afetações e em espanhol –mas mesmo quem não está acostumado com o idioma vai entender a miniaula sem grandes problemas. Conceitos básicos sobre edição de imagens, concepção de uma narrativa coerente e design que potencialize o produto final felizmente estão tanto no vídeo quanto na obra realizada por Laura junto a Alziro Barbosa. Assim, o ponto alto de “Hart” –a palavra significa “coração” em holandês– é sua produção gráfica, desde a escolha do papel e a quantidade de fotos até o baixo-relevo sutil da capa e a maneira como o fotolivro foi encadernado. Sem essa coesão no projeto, os registros de paisagens tão díspares quanto a Islândia e a Amazônia virariam um livro desencontrado ou, caso fosse uma obra longa, chato. “Hart”, porém, é sintético e transmite sua mensagem –ou a falta dela, pois podem ser apenas sensações– sem aborrecer.

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Laura conta no vídeo que pensou em algumas palavras para guiar o trabalho. Mas, mesmo que vocábulos como “ferida”, “cicatriz” e “transformação” ofereçam direções para onde o leitor possa ir, é a crueza de suas poucas cores que une as imagens e as leva para uma quase abstração –a fotógrafa cita pintura como referência para o trabalho. Nas fotos, é possível identificar rastros de nuvens, neblinas, árvores e pedaços de riachos que vão se tornando, acima de tudo, um mergulho num estado de espírito. Afundar nessas sensações depende da vontade de cada leitor para se entregar à proposta dos artistas. Na maioria das vezes, parece-me que as abordagens utilizadas para discorrer sobre elementos impalpáveis fazem com que qualquer imagem possa representar tudo e ao mesmo tempo nada. Há uma urgência em ser poético e procurar algo que materialize mudanças na vida –como se isso fosse fácil. Talvez os discursos precisem ser mais contundentes e menos abertos, sem que o leitor interprete o que bem entender. Saio de “Hart” com a certeza de que é um projeto gráfico excelente, mas cujo conteúdo fotográfico, embora lindo, não me fisgou.

HART
AUTORES Laura Del Rey e Alziro Barbosa
EDITORA autopublicado
QUANTO R$ 60 (48 págs.)
AVALIAÇÃO bom

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