Produção gráfica competente garante êxito da proposta de Elaine Pessoa no fotolivro ‘Nimbus’

DAIGO OLIVA

‘Nimbus’, de Elaine Pessoa – Entre as muitas razões que impulsionaram a volta dos fotolivros neste período dominado por formatos digitais está a necessidade de manuseá-los. Ainda que boas iniciativas como o site espanhol Have a Nice Book satisfaçam a curiosidade de quem vive longe dos grandes centros produtores de fotolivros, ver uma publicação por meio de uma tela não entrega o que um trabalho pode ser em sua totalidade. Aqui, não são só as fotos que importam, mas também o tipo de papel utilizado, a qualidade da impressão, o tamanho da obra e de que forma a narrativa proposta pelo artista é explorada. (Alguns diriam ainda que o cheiro da tinta é relevante, mas aí já acho que é tara de obcecados como Gerhard Steidl.) Enfim, não se trata apenas de virar páginas, não é algo que possa ser saciado só no computador. Temos de tocar os objetos, senti-los. Lembro isso porque a foto acima não corresponde ao que é a capa de “Nimbus”, de Elaine Pessoa, um dos primeiros lançamentos da Fotô Editorial, casa criada em outubro pelo curador e jornalista Eder Chiodetto junto à pesquisadora Fabiana Bruno e à própria autora deste fotolivro. Se as imagens no miolo são todas em preto e branco, predominantemente sombrias e muito granuladas, a capa de “Nimbus” é um negativo do restante do trabalho. Ali, por meio de uma textura creme sobre o papel branco, Elaine introduz a linguagem da obra, mas de maneira luminosa. O relevo, que lembra a marca deixada por um rolo de pintar parede quando já não há mais muita tinta no cilindro, oferece a primeira oportunidade de interação ao leitor, que toca a obra como se fosse um livro em braile.

Dentro, o branco da capa permanece por páginas e páginas até que as fotografias monocromáticas começam a explodir. As pausas também são um ponto importante em “Nimbus”: sequências de imagens são intercaladas por períodos de silêncio, o que dá ritmo ao trabalho, ainda mais quando se trata de registros que caminham para a abstração. Mesmo que seja possível identificar, aqui e ali, cenas da natureza, a granulação intensa faz com que fotografias se transformem em gravuras, e árvores e plantas se tornem a nuvem do título. O segundo momento de interação ocorre por meio das dobras francesas, tipo de acabamento em que as páginas ficam “coladas”. O leitor tem de cortá-las para encontrar as imagens escondidas. Esse tipo de recurso, comum em livros japoneses, cujo design prima pela sutileza, ficou um tanto deslocado nessa obra. Uma vez que as fotos de “Nimbus” giram em torno de uma mesma estética, sem grandes quebras –o que incorre no risco de a obra se tornar monótona–, rasgar ou deixar de rasgar as páginas do livro é indiferente. Por outro lado, a dobra francesa e a transparência do tipo de papel escolhido permitem que a impressão da imagem oculta vaze para a foto aberta, o que intensifica a mistura de rastros entre fotos. Estamos sobretudo no campo do estudo da natureza das imagens, tema que deveria ser ainda mais explorado em trabalhos brasileiros. Para isso, é preciso ter excelência na produção gráfica, caso desse fotolivro.

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NIMBUS
AUTORA Elaine Pessoa
EDITORA Fotô Editorial
QUANTO R$ 90 (68 págs.)
AVALIAÇÃO muito bom

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Haikai: em críticas curtas, o blog comenta fotolivros lançados neste ano.

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