Fôlego para 2020: 14 artistas brasileiros interpretam o título do livro ‘ideias para adiar o fim do mundo’, de Ailton Krenak

Mercury/year, de Verena Smit.
Cassiana Der Haroutiounian

O livro Ideias para adiar o fim do mundo do líder indígena Ailton Krenak, é uma adaptação de duas palestras realizadas em Portugal, nos anos de 2017 e 2019. Ele debate e critica a ideia de humanidade como algo separado da natureza. Ele discute, com um tom irônico, como os brancos abriram mão da liberdade de se conectar em harmonia a natureza, deixando de respeitá-la como família. Para Krenak, como os indígenas consideram a natureza como família, eles respeitam essa conexão, ao fazerem uso dos recursos que ela disponibiliza para a vida.

Quem não se conecta e se mantém separada dessa conexão, deixa de ter qualquer compromisso com todos os aspectos sagrados da natureza, extraindo tudo o que podem dessa terra, sem pensar nela como a Mãe que os nutre.

Para os indígenas, a natureza é um local sagrado, no qual os povos tradicionais têm experiências não apenas de sobreviver, mas é dela que eles também recebem orientação para a vida. É na natureza que eles encontram inspiração para sonhar, cantar, curar, resolver questões práticas da vida. Por isso, a visão que têm de preservação é a que seus antepassados tinham na relação com a Terra e com a natureza. É justamente isso que eles procuram repassar para as futuras gerações e outras pessoas que dialogam com eles.

“Neste encontro, estamos tentando abordar o impacto que nós, humanos, causamos neste organismo vivo que é a Terra, que em algumas culturas continua sendo reconhecida como nossa mãe e provedora em amplos sentidos, não só na dimensão da subsistência e na manutenção das nossas vidas, mas também na dimensão transcendente que dá sentido a nossa existência. Em diferentes lugares do mundo, nos afastamos de uma maneira tão radical dos lugares de origem que o trânsito dos povos já nem é percebido. Atravessamos continentes como se estivéssemos indo ali ao lado. Se é certo que o desenvolvimento de tecnologias eficaz nos permite viajar de um lugar para outro, que as comodidades tornaram fácil a nossa movimentação pelo planeta, também é certo que essas facilidades são acompanhadas por uma perda de sentido dos nossos deslocamentos. Sentido-nos como se estivéssemos soltos num cosmos vazio de sentido e desresponsabilizados de uma ética que possa ser compartilhada, mas sentimos o peso dessa escolha sobre as nossas vidas. Somos alertados o tempo todo para as consequências dessas escolhas recentes que fizemos. E se pudermos dar atenção a alguma visão que escape a essa cegueira que estamos vivendo no mundo todo, talvez ela possa abrir a nossa mente para alguma cooperação entre os povos, não para salvar os outros, mas para salvar a nós mesmos” (Krenak, Ailton, 2019, p.43 e 44).

Decidi convidar 14 artistas brasileiros que eu adoro para interpretarem o título do livro de Krenak e serem um pouco de respiro nessa fase tão difícil para o Brasil e a humanidade em geral. Quando mergulhei nas palavras de Ailton, foi transformador (acho que quase o livro todo está sublinhado). Ele deu palavras para muitos sentimentos que nos rodeiam e não conseguimos pontuar ou não queremos ver. Sentir que estamos perto da natureza e aprendendo (ou reaprendendo) a ouví-la, nos dá esperança e fôlego para seguir.

Respiremos e um feliz novo ciclo. Que venha 2020 com os respiros e as conexões fundamentais para a sobrevivência e para seguir resistindo.

Mercury/year , de Verena Smit.

Verena Smit: nasceu em 1984, em São Paulo, onde trabalha. É bacharel em Comunicação Social com habilitação em Cinema pela FAAP (2005) e em Fotografia pelo International Center of Photography em Nova Iorque (2011). Sua pesquisa se desenvolve a partir da linguagem e jogos de palavras. Em 2018 participou da residência artística AnnexB em Nova York onde fez sua primeira individual. Em 2019 participou da Bienal Internacional de Curitiba e já teve seus trabalhos  também expostos em Portugal e Argentina.

o olhar atento de um respirar Brasil – Amazônia, de Maíra Acayaba.

Maíra Acayaba:  1980, vive e trabalha em São Paulo. Tem o trabalho voltado para a fotografia de arquitetura, interiores, cidades e paisagens que pode ser visto em diversas publicações nacionais e internacionais.

Para ouvir a natureza, de Pedro Hurpia.
Pedro Hurpia: Artista visual e pesquisador na Fundação Kone (Finlândia). Em 2019 foi contemplado com uma bolsa mensal de Artista Residente do município de Sandnes e Condado de Rogaland na Noruega. Participou no Programa de Residências na Nida Art Colony em 2018 com o apoio da Universidade de Vilnius e teve o projeto parcialmente financiado pelo Ministério da Cultura da República da Lituânia. Entre 2015 e 2017, foi docente na Faculdade de Artes Visuais da PUC-Campinas nas disciplinas de Fotografia e Desenho. Em 2015 estudou no Programa de Estudos Avançados em Fotografia do Ateliê Fotô (São Paulo), coordenado pelo curador e crítico Eder Chiodetto.
contar as centenas de milhões de anos de existência destas pedras pode ajudar a adiar o fim do mundo, de Manuela CostaLima.

Manuela CostaLima:  (1983) é artista visual, mora em São Paulo e trabalha com instalações, objetos e caminhadas. Interessa- se pela cidade e por lugares à sua margem. É formada arquiteta pela FAUUSP. Publicou seu primeiro livro de artista, PROJETO CORRESPONDÊNCIA, premiado pelo PROAC, em 2015.
Participa de exposições desde 2014, no Brasil e no exterior. Entre as atividades recentes estão a individual ESCAPE ENTRóPICO – QUADRA escritório de arte [RJ, 2019], NOTHING IN ISOLATION – galeria PABLO’S BIRTHDAY [NY 2018], QUE BARRA – ateliê397 [SP 2018] e EXPLORE – CACN – Centre d’Art Nîmes [Nîmes – France, 2017]. Durante os últimos três meses integrou o  ciclo de artistas residentes do PIVÔ.

Prumo, 2019. Um marco de fronteira sendo delimitado na Amazônia. Um homem de cócoras terminando o Brasil, que até o momento pode ser só brasa. Uma lata velha, um trapo roto. Uma caderneta de anotações militares dos anos 70. Muitas fotos guardadas, só um braço masculino e um uniforme visíveis. Um prumo. Aquele instrumento metálico sólido que verifica se algo está na direção. Ou o modo elegante e garboso de se portar, de Ivan Grilo.

Ivan Grilo: (1986), vive e trabalha em Itatiba. Tem como núcleo central de pesquisa a relevância de arquivos históricos e orais, juntamente com as diferentes possibilidades de leitura sobre um mesmo fato, tomando como ponto de partida a fotografia principalmente como forma de documentação e registro de tempo. Em 2019 lançou o livro-de-artista “Não me lembro bem,” em colaboração com a Familia Editions (NY), que hoje se encontra nos acervos do The Metropolitan Museum of Art (Nova Iorque), Pinacoteca do Estado de São Paulo – Pina, Museu de Arte de São Paulo – MASP), Museu de Arte do Rio, entre outros. Seu trabalho faz parte de importantes coleções de museus do mundo.

sem- título, 2019, de Mariana Tassinari.

Mariana Tassinari: é artista e vem perdendo noites de sono tentando organizar seu arquivo de mais de 6.000 imagens de família. @maritassi

Penso nas relações cosmogônicas e em sua ética como potência geradora de vida, um tipo de vida natural, no qual devemos estar integrados, de Nazareno Rodrigues.

Nazareno Rodrigues: Nazareno aborda em suas obras aspectos relativos à memória, infância, contos de fadas, narrativas… bem como a fragilidade do sujeito contemporâneo frente à impossibilidade de transcendência realizadas em variadas mídias como desenho, esculturas, instalações, vídeos, gravuras, livros de artista, entre outras. Conta com exposições nacionais e internacionais, além de prêmios e publicações em revistas, catálogos e livros de arte, em diversas coleções públicas e privadas.

TERRA BREVE / BREVE TERRA, que consiste em duas bandeiras feitas com cianotipia que foram feitas com o uso da luz do luar e da luz solar. Elas foram instaladas na entrada Porta Romana da Città di Cosa, onde os visitantes podem caminhar entre vestígios e imponentes ruínas de épocas distantes, narrativas e memórias perdidas….as bandeiras substituíram os estandartes que anunciavam a entrada dos visitantes, chamando a atenção para a transitoriedade da humanidade, de Renata de Bonis.

Renata de Bonis: (1984) Vive e trabalha entre Amsterdam e São Paulo. Atualmente está concluindo seu Doutorado em Processos e Procedimentos em Arte Contemporânea na UNESP, São Paulo. De Bonis participa de exposições no Brasil e no exterior, incluindo: A Hora Instável, Galeria Bruno Múrias, Lisboa, Portugal (2019), Conversas em Gondwana- Arquipélago, Centro Cultural São Paulo – CCSP, São Paulo (2019), FUTURuins, Palazzo Fortuny, Veneza, Itália (2018), Elements, Neues Kunsthaus, Ahrenshoop, Alemanha (2018), Der Kula Ring, Eigenheim Galerie, Weimar, Alemanha (2016), Arte Atual, Instituto Tomie Ohtake (2016), Esforço-Desempenho, Galeria Athena Contemporânea, Rio de Janeiro (2016) , preencher o interlúdio sem quebrá-lo, BFA Boatos, São Paulo (2015) e Os Primeiros Dez Anos, Instituto Tomie Ohtake, São Paulo (2011).

Mamar sem medo, sem culpa, sem nenhum objetivo, de Manuela Eichner.

Manuela Eichner: é artista visual e vive e trabalha entre São Paulo e Berlin. Múltipla, a sua produção abarca desde videos e performances até oficinas colaborativas, passando pelo desenvolvimento de ilustrações, instalações e murais. Nessas diferentes frentes recorre sistematicamente a princípios de colagem, ruptura e embaralhamento da unidade espacial. Participou de projetos como Rumos Itaú Cultural em São Paulo, ZKU em Berlim, AnnexB em Nova York e Fikra Graphic Design Biennial em Sharjah.

Aos olhos dos pássaros
o ocidente
é onde o sol se põe
e o ooriente
onde o sol nasce,
apenas isso
– poema de Abbas Kiarostami-
Renato Rios

Renato Rios: (1989) é Artista Visual e Bacharel em Artes Plásticas pela Universidade de Brasília – UnB. Desde 2016 vive e trabalha em SP. Trabalhou como assistente da artista visual Laura Vinci e do pintor Paulo Pasta. Uma das características mais significativas de seu trabalho é sua pesquisa em pintura, arranjando imagens figurativas e signos abstratos em séries, dípticos, polípticos, buscando tecer uma noção de escrita poética e imaginação mítica. Em sua série de pinturas mais recente, chamada Arquétipos, Renato tem procurado construir uma espécie de sintaxe visual própria que, de certa maneira, sistematize o ambiente metafísico produzido em seu trabalho dos últimos  anos, conciliando diferentes correntes de pensamento na constelação das idéias visuais que o conjunto apresenta.

“Logo será noite”, serie de trabalhos é inspirada no livro de Eratóstenes, “Mitologia do firmamento – Catasterismo”, catasterismo é o ato de transformar uma personagem em estrela/constelação, com o objetio de eternizá-la no firmamento, de Leka Mendes.

Leka Mendes: Leka Mendes (São Paulo, 1980), graduada em Programação Visual na Faculdade de Belas Artes (2001-2004).  Com a produção ancorada no fotográfico, seu trabalho utiliza tal linguagem desdobrada por formatos, meios e abordagens variadas. Um dos principais eixos é a investigação da paisagem e da relação do homem com a natureza, que pode ser vista por meio de instalações site specific, objetos, desenhos, colagens, livros de artista e, obviamente, pela própria fotografia. Participo de mostras coletivas em São Paulo, Ribeirão Preto, Valparaiso e Cincinnati, nos EUA.  Sua obra faz parte das seguintes coleções: MABRI, Museu de Arte de Britânia, Goiás; CCSP, Centro Cultural São Paulo, São Paulo, Brasil, The Fine Art Laboratory, FAL -Universidade de Arte de Musashino, Tokyo, Japão; MARGS, Museu de Arte do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS / Brasil; Fundacíon Luiz Seoane, La Coruña, Espanha.

Suspender o céu é ampliar o nosso horizonte; não o horizonte prospectivo, mas um existencial, de Marcelo Moscheta.

Marcelo Moscheta: Radicado há 25 anos em Campinas, Marcelo Moscheta é artista visual e educador formado pela UNICAMP. Desde 2007, realiza obras e exposições que nascem de seus deslocamentos por lugares remotos, criando instalações e objetos, desenhos e fotografias. Em 2015 desenvolve o projeto Arrasto em que percorre toda a extensão do Rio Tietê coletando minerais em suas duas margens. Em 2013, participa da publicação Vitamin D2 – um antologia sobre o Desenho Contemporâneo. Já realizou residências como o Plataforma Atacama, LABVERDE na Floresta Amazônica, Flora Ars+Natura na Colômbia, além de Uruguai, Ucrânia, Itália, França, Alemanha, China e Polo Norte. A relação que os rios estabelecem com a paisagem ao longo de seu curso também tem destaque em sua produção e atualmente pesquisa fronteiras imaginárias e limites impostos arbitrariamente a territórios. Além disso tem voltado sua atenção para a educação, abrindo seu ateliê para cursos e encontros de formação para a comunidade.Em 2017 recebeu a bolsa de estudos da Fundação Pollock-Krasner de Nova York e em 2015 participou do The Drawing Center Open Sessions Program na mesma cidade. Possui obras nas coleções do MAM SP, Pinacoteca de SP e El Museo del Barrio de Nova York entre outros.

Amuleto Comemorativo no.7 – Casamento, 2019, cerâmica, pedras semi preciosas e latão, 8x6cm. Os egípcios adoravam amuletos de diversos formatos e materiais, que ofereciam boa sorte e proteção. Os amuletos comemorativos egípcios eram emitidos no acontecimento de um evento importante e no seu verso eram inscritos a celebração e sua data. Nesse trabalho foram criados pequenos amuletos simbolizando cada ritual de passagem da vida de uma pessoa, registrados no verso de cada peça, de Bruna Albuquerque.

Bruna Albuquerque:  (1981, São Paulo) vive e trabalha em São Paulo, Brasil. Formada em arquitetura, seu trabalho utiliza cerâmica, pedras e metais para compor com cores, ritmos e símbolos.

sem-título, 2019, de Candice Japiassu.

Candice Japiassu: é artista visual e fotógrafa. Tem pós-graduação em fotografia pela FAAP e mestrado em Fotografia Contemporânea; Práticas e Filosofias pela Central Saint Martins em Londres. Já expôs em São Paulo, Maceió, Coreia do Sul, Espanha, Suiça e Reino Unido.