As histórias sugeridas pelo fotógrafo americano Todd Hido em suas imagens solitárias

Cassiana Der Haroutiounian

Eu dirijo, Eu dirijo muito.

As pessoas me perguntam como encontro minhas fotos. Eu digo a eles que eu dirijo por aí. Eu dirijo e dirijo e não encontro nada que seja interessante para mim. Mas então, algo chama. Algo que parece meio fora ou talvez um espaço vazio. As vezes é uma cena triste. Eu gosto desse tipo de coisa. Então, eu tiro as fotos e algumas são boas. E assim, continuo dirigindo, olhando e tirando fotos.

Todd Hido – e o statement que ele usa para descrever suas jornadas

Conhecido no mundo da arte contemporânea por seus livros impecáveis, Todd Hido (Ohio, EUA, 1968) carrega a melancolia em suas imagens, seja em paisagens inóspitas ou nos retratos das mulheres que cruzaram seu caminho.

Na semana passada, batemos um papo e, entre alguns devaneios sobre o vazio, passeamos um pouco por suas obras e conversamos sobre o processo, sobre usar a luz ambiente, natural, sem nenhum drama a mais inserido por luzes artificiais – apenas para alguns retratos fogem a essa regra. “Meus amigos mais próximos definem meu trabalho como inquietante por serem tão reais e precisos”, contou-me ele.

Hido parte de suas memórias da infância para percorrer, em longas viagens solitárias, os subúrbios dos Estados Unidos resgatando suas próprias lembranças em imagens silenciosas, com uma paleta de cor que acalma e instiga o olhar. Há uma intimidade que parece fora de alcance, como se o espectador fosse um voyeur: “Minha infância e meus relacionamentos passados desempenham um papel enorme no tipo de coisa que eu faço e que percebo no mundo”.

Durante as longas viagens, ele adora passar um tempo sozinho e dirigir permeando as paisagens, fotografando sem pressa. Pode até ser que ele não sinta a solidão em suas viagens e em sua vida, mas, de alguma forma, esse é um sentimento percebido em seu trabalho, nas narrativas construídas e retratadas. Talvez, por inúmeras das fotos serem a noite, quando as luzes acendem e o interior escoa para o exterior, temos certeza de que algo está acontecendo naquela cena.

Em imagens geralmente com neblina e quase nenhum ruído, entramos na cena como um mergulho contido no frame de um filme. Suas imagens provocam o respiro, o tempo e a curiosidade da cena, fazendo uma alusão ao misterioso mundo suburbano norte-americano. Há algo que acontece quando nada está acontecendo. Essa referência do cinema é só de quem vê, já que ele não se atenta a isso e não toma muito essa arte como base. Cada espectador vê uma coisa. Ele apenas sugere a cena e acredita que a arte reside no espectador, livre para toda interpretação e, por isso também, prefere não dar nome às imagens.

“É curioso que minhas fotos tenham uma sensação cinematográfica. Gosto muito de fotografar e gosto de trabalhar com suas limitações. Não tenho aspirações para fazer filmes e nunca. E eu fiz apenas alguns vídeos. O mais recente foi encomendado pela Joy Division pelo seu 40º aniversário.

Além de Hitchcock, não sou realmente inspirado por filmes. Existe uma estranheza no trabalho de David Lynch em que encontro parentesco, mas isso não exerce grande influência sobre mim”.

Suas fotografias parecem apreender o momento antes de uma progressão narrativa ou da aproximação de uma cena, fazendo-nos prender a respiração.

Para Hido, muitas vezes não há diferença entre um espaço vazio e um ser humano: “As vezes, um ser humano acaba sendo um espaço vazio mais profundo que a própria paisagem”, pondera. Ele varia entre a tensão de retratar um estranho e o prazer do corpo conhecido a sua frente. Quase sempre essas mulheres retratadas posam em salas vazias com olhares desolados, dando a impressão de falta de raízes, isolamento, deserção, e perda. Esses corpos e olhares funcionam como uma extensão da paisagem. De fato, o respirar desse vazio, sendo ele a natureza ou a pessoa, existe em suas imagens e nos atravessa.

Com mais 10 livros publicados,  suas fotografias fazem parte de importantíssimas coleções públicas e privadas, incluindo Whitney Museum, em NY; Getty, em Los Angeles; Moma, em São Francisco, além dele mesmo ter uma das maiores coleções de álbuns de foto do mundo, construída ao longo de mais de 25 anos.