Paisagens reinventadas e oníricas – a fotografia da dupla Inka e Niclas
“Mesmo que tentemos nos preparar o máximo possível com antecedência, geralmente acabamos ficando sem tempo, sem luz e precisamos trabalhar muito intensamente na cena. Quando terminamos, nos encontramos, frequentemente, sozinhos nessa paisagem totalmente escura. Nossos filhos se acostumaram a estar nessa floresta escura como breu e montanhas ventosas. Então é bom voltar ao trailer e encontrar algo para comer e algumas cervejas geladas”
Um pequeno resumo de como é a vida da dupla de fotógrafos suecos, Inka e Niclas Lindergard, que vivem e trabalham em Estocolmo – quando não estão imersos em paisagens inóspitas pelo mundo atrás de imagens incrivelmente lindas. A história dos dois como casal e como dupla de profissionais começou quase ao mesmo tempo. Juntos há 15 anos, eles se conheceram no curso de fotografia e decidiram, no final da temporada, viajar para a cabana de uma amiga em um cafezal na Tanzânia, com 300 rolos de filme na mala e muitas ideias não concretas de qual projeto poderiam realizar juntos, sendo que cada um já tinha sua forma de fotografar.
As fotografias de Inkas e Niclas têm como ponto de partida representações genéricas e comuns de paisagens e fenômenos naturais, investigando como as fotografias formam nossas expectativas da natureza e das paisagens e sobre o que constitui os poderosos efeitos psicológicos destes diferentes fenômenos, que mobiliza pessoas ao redor do mundo para apreender por um segundo o inalcançável.
A partir dessa viagem para a cabana, o pensar e observar a paisagem, os eventos mágicos e exuberantes da natureza e o tempo de cada coisa estão latentes em suas obras. Em 3 meses de muitas provas, decidiram ir a um safari e observar os turistas quase sempre vestidos iguais, com as mesmas expectativas e a câmera/celular disparando sem parar na espera “do grande fenômeno”. Assim surgiu o projeto “watching humans watching”.
“Muitas vezes, esperávamos as pessoas nesses lugares e pensávamos no que as levavas a irem para esses lugares, na expectativa de acontecer alguma coisa espetacular, longe do palpável, observando a natureza.” Vendo o momento de exposição como fundamental, muitas vezes pensam a fotografia como instalações temporárias e am ações feitas exclusivamente para a câmera. Desde sempre se questionam o que esse fluxo incessante de imagens de paisagens nos provoca e o que acontece durante o ato de tirar uma fotografia, numa intersecção entre a realidade de uma foto e a realidade física.
Eles, que viajam com seu motorhome há uns sete anos, podem experimentar a paisagem ao redor de uma maneira muito mais intensa e profunda, resultando em fotografias de paisagens reinventadas, que transitam entre o real e o imaginário – e sempre ouvindo música. Segundo eles, a paisagem quase sempre está ligada a uma trilha sonora.
Na série “Family portraits”, a dupla e seus dois filhos, em autorretratos com flash, se colocam em paisagem exuberantes com casacos refletores e se tornam parte dela, anônimos, como um objeto de luz no horizonte. Uma reflexão sobre a representação e consumo excessivo de grandes cenários, mas também sobre o momento mágico da exposição.
De tanto exercitarem a observação de cada ação da natureza, sem pressa, respeitando o microcosmos e o macrocosmos, eles sabem com precisão o que estão buscando e têm propriedade sobre a nuvem por exemplo – o filho mais velho deles já sabe o que cada um deles espera de uma imagem. Permanecem atentos até o clique perfeito: “agora mesmo estou sentindo muita saudade de sentar numa pedra e ficar observando a natureza”, refletiu Inka, saudosa.
Ao invés de chegarem com uma surpresa ao local escolhido, fazem uma pesquisa detalhada no google e nas hashtags do instagram, referentes ao lugar. Não para saturar o próprio olhar, mas para se apropriarem de todos os ângulos e checarem as condições climáticas do lugar, já que o tempo é um fator bem importante para a imagem que decidem fazer.
Assim como todos nós, nas diferenças marcantes deste ano de 2020, os planos deles têm sido postergados. Sem poder viajar ou planejar qualquer coisa, a quarentena os deixou mais introspectivos e experimentando paisagens do lado de fora de casa. O trabalho atual são flores típicas suecas que remetem às infâncias de ambos e em paisagens impressas como esculturas em tecidos ou pedras. Em janeiro de 2021, depois de tantos adiamentos, eles têm agendadas três vernissages: duas em Berlim e uma em Malmo, na Suécia. Se elas acontecerão, só o amanhã poderá nos dizer.
A potência fabulosa entre os dois é perceptível na conversa fácil e na troca de olhares durante nosso papo que se prolonga para paisagens exuberantes, mágicas, oníricas e inventadas, com mares rosa, céus de purpurina, e profundos pontos de luz em paisagens espalhadas pelo mundo. Em tempos sombrios, incertos e adiados, são especialmente necessárias.