Gui Mohallem transporta bloco de 1t de terra para investigar deslocamentos

DAIGO OLIVA

Quando Gui Mohallem terminou de produzir “Tcharafna”, no ano passado, um grande silêncio o sequestrou. Após se tornar o interlocutor de sua família com os parentes libaneses de seu pai e cicatrizar as feridas domésticas de ser o último de cinco filhos em uma cultura que favorece o primogênito, o fotógrafo sentiu que a dor que o movia havia desaparecido. E, com ela, a obra em si.

O vazio durou pouco, e Mohallem decidiu refazer o caminho que o levou até aquele ponto e entender por que as buscas por pertencimento, presentes tanto em “Welcome Home”, no qual registra sua experiência em um santuário no sudoeste dos EUA, quanto em “Tcharafna”, em que visitou várias vezes o Líbano para achar seus parentes distantes, haviam se pulverizado.

Decidiu revisar todas as imagens realizadas até então e procurou entender
em que lugar o sentimento de fazer parte de algo se encontra. Em vez de fotos de participantes de uma comunidade durante instantes de contemplação ou de signos sobre a sua origem familiar, selecionou paisagens enevoadas, em que a natureza se revela ao mesmo tempo divina e destruidora, capaz de nos lembrar da pequenez da humanidade diante de fenômenos incontroláveis.

Em um dos três vídeos na exposição “Terra”, que será aberta nesta quinta (13), em São Paulo, na Emma Thomas, Mohallem exibe a projeção de uma nuvem aparentemente impassível, mas que, de repente, explode em trovões. Esta mesma dualidade aparece nos outros filmes, em que o fotógrafo mesclou diversos registros em um só plano. Ainda assim, não são nem os vídeos nem as paisagens que chamam a atenção nessa espécie de retrospectiva e terapia.

No centro da mostra, Mohallem montou uma escultura feita de terra trazida de sua cidade, Itajubá, em Minas Gerais. O bloco de uma tonelada, carregado em carretos e em seu carro, também faz o papel do duplo neste trabalho. Ao mesmo tempo em que representa o deslocamento físico, deixa também em sua terra natal uma “cova rasa”, como definiu o curador Gabriel Bogossian.

Para juntar toda a terra mineira, o artista usou parafina, material que já havia aparecido nos objetos de ‘Tcharafna”, nos quais misturava a fotos da família. Segundo Mohallem, trazer a terra da casa de seus pais significa falar ainda sobre “deslocamentos forçados”. “O que não quer dizer apenas o sírio que foge da guerra. A diáspora acontece também nas pequenas comunidades do Brasil em que jovens LGBT que têm de sair, ou então não conseguem viver.”

Assim, o trabalho ganha também dimensão política e se descola da vida do artista. “Quando você fala sobre terra, fala de chão, terra natal, propriedade, algo que sepulta e também germina. É sobre tudo isso que estou falando.”

TERRA
ARTISTA
Gui Mohallem
QUANDO
abertura nesta quinta (13), às 18h; seg a sex., das 11h às 19h, sáb., das 11h às 17h; até 26/9
ONDE
Emma Thomas, r. Estados Unidos, 2205, tel. (11) 3063-2149
QUANTO
grátis

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