De Dentro #11

DAIGO OLIVA

O De Dentro dessa semana é de Cassiana Der Haroutiounian.

Nunca tinha pensado em ir para a Armênia… O vovô Zaven morreu em março de 2006, e a saudade apertava. Alguns anos se passaram e em fevereiro de 2010 tomei a decisão de embarcar sozinha para essa terra que ainda parecia super distante de mim.

A vontade era de me conectar um pouco com o meu avô, com algumas histórias inusitadas e, talvez, comigo mesma. Foi uma decisão sentida, quase nada racional. Em uma manhã quente desse verão, passei horas na casa da vovó Nuver pensando.

Na hora de comunicar a ela sobre minha viagem, veio primeiro o susto e depois o borbulhar de histórias divertidas e lindas deles dois nesse país. Acho que a fiz se ligar um pouco com tudo isso também. Meu coração, não sei ao certo, se disparava ou se contorcia mais, conforme ia ouvindo tanta memória… Mas o fato era que estava sentindo e ponto.

Num armário abarrotado de álbuns de foto, imagens e mais imagens. O que eu estava buscando?! Não sei, mas revirava esses anos de imagens, como se quisesse encontrar um aval do meu avô para minha decisão. Acho que o que eu queria era dividir com ele…

Fui me afastando desse dia real e entrando cada vez mais no mundo deles. Uma imagem me deixou paralisada, com o coração saudoso… Era o vovô Zaven e a vovô Nuver fazendo um brinde feliz, em Beirute. Antes ou depois de uma das idas deles para a Armênia… Essa ainda foto mexe comigo, me dá uma felicidade tremenda, uma segurança de que tudo acabará bem com um brinde feliz!

Vontade de chegar logo a esse país, que também é um pedaço de mim… Tirei a foto do álbum e grudei no meu diário da viagem, como um amuleto… Eles viveram, e viveram viajando por esse mundo. Talvez minhas asas de querer me jogar no mundo tenha vindo do meu avô… Vai saber…

Quando se brinda em armênio, usa-se a palavra “guenatz”. Sempre tinha ouvido, mas sem dar tanta importância… Quando cheguei nesse país do Cáucaso, desde o café da manhã até a hora de dormir, era um “guenatz” com vodka ou conhaque.

E parece que brindar faz parte da rotina de todos eles. Que feliz! Olhava para essa imagem todo dia quando chegava ao hotel e, entre lágrimas e uma sensação de plenitude, ia dormir feliz.

Desde então, a Armênia se tornou meu refúgio e meu ponto de encontro comigo mesma. O encontro das minhas raízes com uma saudade e, agora, histórias que vou dividir com eles… O vovô estava lá, em todas as minhas três idas a Armênia. O que esse lugar causa em mim não consigo explicar…

O que essas pessas me fazem sentir, muito menos… Tudo isso só enche meu coração e é como se estivesse sempre me conectando a algo que esqueci e que me traz uma felicidade doce e tranquila…

Cassiana Der Haroutiounian é editora de fotografia da “Serafina”. Ao lado de Gary e Cesar Gananian, dirigiu “Rapsódia Armênia”.

Toda segunda, o Entretempos publica a seção De Dentro –uma pessoa elege uma imagem importante em sua vida (uma fotografia, um quadro, uma capa de disco, um postal, o que vier a cabeça) para relembrar memórias e sensações ou relatar o porquê daquela figura ser tão fundamental.

Gostou? Confira os outros De Dentro: Juliana Freire, Daigo Oliva, Lulina, Daniel Klajmic, Mônica Maia, Nazareno Rodrigues, Beto Brant, Manuel da Costa Pinto, Marcos Augusto Gonçalves e Cassiano Elek Machado.

Comentários

  1. Adorei o relato.
    Sou filha de mãe nascida na Síria, de origem armênia.
    Essas histórias mexem comigo, pois cresci ouvindo minha mãe contar tudo o que passou em sua terra natal.
    Obrigada.
    Mostrarei para ela também.
    Fiquei emocionada.
    Um abraço.

    Nadia Cristina

  2. História narrada com toda a doçura, e não poderia ser diferente…conheci o Sr. Zaven e Sra. Nuver…conheço uma parte muito linda desta família Der Haroutiounian.
    Cassiana linda, que orgulho de você!! Sensibilidade à flor da pele, minha menina!
    Beijão enorme! Saudades!

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